Foto:
A afirmação é do defensor-geral do Estado, Aldy Mello Filho, em entrevista a O Imparcial. Ele explica que o papel da Defensoria Pública é promover a defesa daqueles que estão sob a custódia do Estado e não têm recursos para pagar advogados. Esse trabalho avançou nos últimos anos, mas muito presos do Complexo de Pedrinhas são provisórios e oriundos de municípios onde não há defensor para fazer o acompanhamento do processo na comarca, contribuindo para a superlotação.
A Defensoria Pública do Estado do Maranhão (DPE/MA) integra o Comitê de Gestão Integrada do Plano de Ação de Pacificação das Prisões em São Luís, órgão interinstitucional composto por representantes dos Governos Estadual e Federal, Legislativo, Judiciário e Ministério Público. Dentre as 11 ações emergenciais definidas pelo Comitê está a realização de um mutirão carcerário promovido pela Defensoria Pública, Judiciário e Ministério Público, iniciado no último dia 15. A segunda etapa do mutirão contará com o auxílio da Força Nacional em Execução Penal da Defensoria Pública, que terá início amanhã (27), com a participação de 34 defensores públicos de outros estados. Em entrevista exclusiva ao O Imparcial, o defensor geral do Estado, Aldy Mello de Araújo Filho, explica como serão realizados os trabalhos e aponta os resultados esperados.
O Imparcial – Desde o agravamento da crise no sistema penitenciário local, a Defensoria Pública do Estado tem participado das discussões e integrado o Comitê de Ações Estratégicas. Qual o papel da instituição nesse contexto?
Aldy Mello Filho – A Defensoria Pública do Estado exerce papel fundamental. Primeiro, porque é órgão de execução penal, segundo pela experiência acumulada pelos defensores públicos que atuam na área e que conhecem profundamente a realidade de Pedrinhas, uma vez que realizam atendimentos regulares no Complexo. Participamos do Comitê na condição de convidados, ao lado das demais instituições do Sistema de Justiça. Como a superpopulação carcerária no país e no estado tem igualmente relação com o regular acompanhamento dos processos, cabe à Defensoria Pública, por previsão legal e constitucional, promover a defesa daqueles que se encontram sob a custódia penal do estado, sobretudo considerando que a maioria expressiva das pessoas em situação de prisão no país e no Maranhão não possui recursos para contratar um advogado particular.
O Imparcial – A realização de mutirões em momentos de crise não revela a fragilidade do sistema judicial no controle do volume de processos submetidos à sua apreciação?
Aldy Mello Filho – O Sistema de Justiça, através da atuação de seus integrantes - advogados, defensores públicos, promotores e juízes – deve guardar vigilância dos atos que estão sob sua responsabilidade para que seja mantido sob controle o fluxo de entrada e de saída dos processos. Há situações pontuais que, por vezes, impedem o equilíbrio dessa equação, e isso pode ocorrer por razões que vão desde a deficiência de quadros até a própria gestão dos procedimentos. A preocupação do Sistema em garantir o seu regular funcionamento não deve, no entanto, ser contraposta à ideia de que, em situações emergenciais, haja um esforço maior em atingir esse equilíbrio, por isso acho válida a proposta do mutirão, que é sempre uma oportunidade de reparar eventuais deficiências. Por outro lado, se o Sistema estiver funcionando de maneira adequada, é também uma oportunidade para prestar contas do trabalho que está sendo feito. Por isso, o mutirão, se realizado de maneira adequada, é algo sempre oportuno.
O Imparcial – O Índice Nacional de Acesso à Justiça (Inaj), criado pelo Ministério da Justiça em dezembro de 2013, ao considerar o número de equipamentos judiciais e extrajudiciais no estado, afirma que o Maranhão tem o pior acesso à Justiça do país. Esse dado não guarda relação com a crise do sistema penitenciário?
Aldy Mello Filho – O Atlas do Acesso à Justiça no Brasil foi criado para quantificar o número de profissionais e de unidades da Justiça (Defensoria Pública, Ministério Público e instâncias do Judiciário) e de serviços extrajudiciais (cartórios, delegacias e procons) em todas as unidades da federação de maneira a medir o grau de dificuldade de acesso aos serviços públicos disponíveis, tendo como parâmetros o número de habitantes de cada estado e o seu Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Ora, se a população teve, por qualquer motivo, dificultado seu acesso às instâncias judiciais em algum momento isso terá um reflexo na sua vida. No caso daqueles que estão em regime de cumprimento de pena, não receber a assistência jurídica que a Constituição lhe assegura pode importar em permanecer sob custódia por tempo superior ao fixado na sentença. Logo, a falta de defesa, ao lado de outros fatores, como a escassez de vagas, tem implicação direta no universo carcerário. Estados com baixo índice de acesso à Justiça terão sempre mais problemas em administrar seu sistema prisional.
O Imparcial – Segundo o relatório preliminar do Grupo de Trabalho sobre Detenção Arbitrária das Nações Unidas (GTDA/ONU), que realizou visita oficial ao país em março de 2013, a escassez de defensores públicos constitui uma das principais causas da superlotação das prisões brasileiras. A ampliação do número de defensores públicos, aliás, está entre as recomendações mais frequentes feitas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) durante os mutirões carcerários. Como o senhor avalia esses dados?
Aldy Mello Filho – A avaliação é correta, sobretudo porque a situação das prisões expõe uma realidade peculiar do Brasil: o preso, em geral, é negro e pobre. Isso explica também em parte o patrulhamento ideológico contra qualquer medida em favor dessas pessoas. A baixa capacidade de vocalização desses segmentos, aliada à visão de que não se deve investir no sistema prisional, porque há outras prioridades, tem afastado a possibilidade de mudar essa realidade e, com isso, prevenir novos episódios de violência que, mais cedo ou mais tarde, se voltam contra toda a sociedade. A Defensoria Pública do Estado, nos últimos três anos, ampliou seu trabalho na área criminal e de execução penal. Hoje, temos defensores públicos em todas as Varas Criminais da Capital, situação diferente da vivenciada há três anos. Isso tem permitido o acompanhamento regular dos presos que ainda não têm sentença com trânsito em julgado, os chamados presos provisórios, que são em maior número no estado do que aqueles que já foram definitivamente condenados. Acompanhamos também os processos em tramitação nas duas Varas de Execução Penal da Capital. São sete defensores públicos com atuação permanente no Complexo de Pedrinhas. Há três anos eram apenas dois defensores. Atualmente, estamos em 56 municípios. Até 2010, atuávamos em apenas 11. Foram inauguradas 20 novas unidades de atendimento da Defensoria no interior do estado no último triênio, passando de 6 para 26. Em todos os municípios temos defensores com atuação na área criminal e de execução penal, inclusive em Caxias, Paço do Lumiar, Açailândia, Chapadinha, Pedreiras, Codó, Viana, Bacabal, Santa Inês, Timon e Imperatriz, que possuem unidades prisionais. O problema está nos locais onde não temos núcleos da Defensoria. Nesses locais, não há como fazer o acompanhamento. Como grande parte daqueles que estão em Pedrinhas são presos provisórios do interior do estado, onde não tem Defensoria não há muito o que fazer, já que o processo tramita na comarca de origem. Esses presos ficam desatendidos e isso contribui para o quadro de superlotação em Pedrinhas.
O Imparcial – Como funcionará o mutirão e quais os resultados esperados?
Aldy Mello Filho – O mutirão teve início no último dia 15, resultado de um esforço conjunto da Defensoria Estadual, Poder Judiciário e Ministério Público. Nessa primeira etapa, estão sendo analisados os processos de presos provisórios da Comarca de São Luís, incluindo Raposa, Paço do Lumiar e São José de Ribamar. São 21 defensores públicos maranhenses em atuação. Os defensores com atuação nos núcleos regionais do interior também estão priorizando a análise dos processos criminais. A partir do dia 27 de janeiro, 34 defensores públicos de outros estados se integrarão ao trabalho. São profissionais que compõem a Força Nacional em Execução Penal da Defensoria Pública, que auxilia estados que estejam enfrentando problemas em seu sistema carcerário. A Força já atuou em Minas Gerais e Santa Catarina, inclusive, nesse último estado, com o auxílio de dois defensores do Maranhão. O objetivo é fazer a revisão de todos os processos dos presos do Complexo de Pedrinhas, definitivos e provisórios. Os processos do interior serão remetidos para a capital. Após o estudo dos casos e o ajuizamento das medidas, os defensores entrevistarão pessoalmente os detentos para informar as providências tomadas. Não há como prever o número de pessoas que serão liberadas. O relaxamento da prisão é sempre a consequência e não a causa do pedido, que será formulado pela Defensoria Pública, analisado pelo Ministério Público e, ao final, decidido pelo Judiciário. Nosso papel não é obter liberações aleatórias, até porque os pedidos têm previsão legal expressa, mas garantir que o cidadão não permaneça mais tempo preso do que foi fixado na sentença. Para que o resultado das ações do mutirão seja efetivo, é preciso que sejam nomeados novos defensores públicos, de modo a dar continuidade ao trabalho realizado.
Fonte: Jornal O Imparcial
Há 67 dias
Há 67 dias
Há 67 dias
Há 67 dias
Qual o seu nível de satisfação com essa página?