Era para ser mais um leilão público de terras, ontem, no Hotel Praia Mar, mas acabou na revelação de uma ferida exposta nas questões fundiárias dentro da ilha de São Luís. A área de 89 hectares, a ser arrematada pelo preço mínimo de R$ 250 mil, em leilão, e dita de propriedade particular, também estava registrada no Instituto de Colonização e Terras do Maranhão (Iterma), como área de assentamento. O pedaço de terra disposto à venda por meio do leilão está encravado dentro da área da gleba Tibiri-Pedrinhas, da comunidade de Anajatiua.
A Defensoria Pública do Maranhão, por meio do defensor Alberto Tavares, havia encaminhado ofício ao leiloeiro oficial Dalton Leal requerendo a suspensão do leilão que dispunha o corretor de imóveis, João Ernani Reis como proprietário da terra, já que além dele, a empresa Fazendas Reunidas Rio Bravo também está em disputa possessória com os assentados. Ou seja, quem tentou acompanhar o leilão percebeu-se diante de três proprietários para um pedaço só de terra.
Para os organizadores do leilão, que na melhor das hipóteses aguardavam uma gama de corretores de imóveis e construtoras, interessados na região, alvo de grande especulação imobiliária, depararam-se com trabalhadores rurais, que foram defender na voz, o pedaço de chão que aprenderam a cultivar desde 1997, quando, então, o governo estadual, por meio da portaria n°110/97, sedimentou o projeto de assentamento Anajatiua.
O curioso é que, no edital de abertura do leilão, o então proprietário João Ernani Reis juntou a escritura da terra, e documentos que o correspondem também como dono da área em litígio. A escritura de compra e venda apresentada pelo corretor, registrada no cartório do 1° ofício extrajudicial, discrimina como vendedor Antônio Cleto Pinheiro. A terra teria sido comprada por R$ 20 mil, no dia 12 de junho de 2009.
Rodeado de trabalhadores rurais que deixaram, naquela manhã, a roça para pisar pela primeira vez num hotel quatro estrelas, o leiloeiro avaliou que o leilão continuaria, mas sob o signo do conflito, já que os pretensos novos compradores sabiam que poderiam levar ao invés da terra, um imenso barril de pólvora.
Não houve comprador para a área, o leilão acabou, mas ainda há a possibilidade de futuros compradores arrematarem o lote em até 15 dias, não sem ainda ter às mãos, junto com a compra, o peso de uma batalha judicial que deverá ser travada para garantir o direito de propriedade ao mais justo dono.
Eugênio Ferreira, 73 anos, já calejou mais as mãos de rezar por uma velhice tranquila, plantando sua roça de milho na área. Ele foi um dos primeiros a chegar à região. “Eu ainda faço minha roça, ainda trabalho, eu peço só a Deus que a gente fique com a terra que de direito recebemos, nós estamos lá e todo dia estamos na lida dessa terra”, avaliou o trabalhador rural.
Sob litígio – O advogado Rafael Silva, vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Maranhão (OAB-MA), declarou em ata do leilão, que a terra está sob litígio com um terceiro proprietário e ainda que comprovadamente como terra pública, o instituto do usucapião – o direito de posse sobre a terra – já daria aos assentados a possibilidade de receberem o título de proprietários da área.
A região está sendo avaliada pela Comissão de Direitos Humanos e pelo Núcleo de Moradia da DPE/MA como foco de frequentes conflitos por terra. Fruto também da valorização da área, com o aporte de indústrias e grandes empresas. No mesmo leilão foram oferecidos mais dois lotes de terra além da região em litígio. Um deles, localizado entre a Vila Maranhão e Conceição do Bacanga, tem 30,94 hectares, pelo preço mínimo de R$ 9,974 milhões, um metro quadrado avaliado em mais ou menos R$ 30,62. O fundo da propriedade é cruzada pelas linhas de transmissão da Usina Termelétrica do Itaqui (MPX) e a cerca de 500 metros de um braço de mar que dá acesso à Baía de São Marcos.
Fonte: Matéria publicada no jornal O Imparcial, na edição de sábado, 19 de fevereiro.
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